Ainda que os maiores nomes da história do esporte se notabilizem por diversas características marcantes ao longo dos anos, é certo dizer que seus maiores talentos acabam aperfeiçoados após anos de carreira — principalmente no mais alto nível. Até mesmo o maior nome do Brasil na Fórmula 1, por exemplo, já viveu dias infelizes e cometeu erros que não necessariamente seriam cometidos com um pouco mais de atenção. No fim, tudo vira aprendizado. E foi o que Ayrton Senna viveu no dia 15 de maio de 1988.
Naquele dia, a categoria mais importante do esporte a motor tinha um compromisso marcado no GP de Mônaco, pista em que tantas vezes Ayrton levou seus fãs — e dos outros — à loucura. Maior vencedor da história de Monte Carlo na F1, com seis triunfos, Senna poderia ter tido sete vitórias, não fosse a fatídica batida naquela edição de 1988.
No ano em que conquistou seu primeiro título mundial, o brasileiro já vivia uma rivalidade interna acirrada com Alain Prost na McLaren. A questão, entretanto, é que o nível apresentado por Senna em Mônaco era simplesmente inalcançável, até mesmo para o ‘Professor’.
A classificação do dia anterior, inclusive, deu o tom do que seria visto na corrida de domingo. Ayrton garantiu a pole com o tempo de 1min23s998, incríveis 2s6 à frente do primeiro carro de outra equipe, o terceiro colocado Gerhard Berger, da Ferrari, e com 1s4 de vantagem para o próprio companheiro — que alinharia em segundo.
Senna estava em um nível completamente diferente durante aquele fim de semana da F1 em Mônaco (Foto: F1)
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Anos depois, uma frase do brasileiro sobre aquela sessão classificatória ficaria marcada para sempre na história do automobilismo. Ayrton afirmou ter se sentido “em outra dimensão” e disse que, pela primeira vez na vida, sentiu que não estava pilotando de forma consciente.
Para o piloto, a McLaren estava dentro de um túnel permanente, e cada curva era feita simplesmente com a naturalidade de quem já conhecia o traçado como ninguém. A sensação assustou Ayrton, segundo ele próprio, e o fez encerrar a sessão ao retornar para os boxes da equipe inglesa.
“Eu estava em uma dimensão diferente. Era como se eu estivesse em um túnel, muito além de meu entendimento consciente. Naquele dia, eu disse a mim mesmo: ‘esse foi o máximo, não há mais espaço para melhorar’. Eu realmente nunca mais tive esse sentimento novamente”, declarou Ayrton anos depois.
Senna logo após a largada do GP de Mônaco de 1988, liderando o pelotão à frente de Berger (Foto: F1)
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Com 50s de desvantagem para o companheiro de equipe, Prost começou a acelerar. Logo depois de o francês cortar 4s nas primeiras voltas, o brasileiro voltou a apertar o ritmo e o que se viu foi uma disputa particular entre as duas McLaren, que passaram a alternar as voltas mais rápidas da prova. A única certeza, naquele momento, era de um 1-2 tranquilo para a escuderia de Woking.
A questão central, no entanto, é que até os melhores erram. Avisado pela McLaren de que não sofreria ataques de Prost, Ayrton foi aconselhado a diminuir a velocidade. Com 55s de vantagem para o segundo colocado, era uma questão de tempo até conquistar a segunda vitória na temporada — mas a mudança de ritmo não fez bem ao tricampeão.
Não fosse pelo erro na Portier, Senna teria conquistado uma das vitórias mais dominantes da história da F1 (Foto: F1)
No fim, apenas dez carros completaram aquela caótica corrida — que só foi tranquila aos olhos de Senna, muito à frente do pelotão. Prost, Berger, Michele Alboreto, Derek Warwick, Jonathan Palmer, Riccardo Patrese, Yannick Dalmas, Thierry Boutsen, Nicola Larini e Ivan Capelli cruzaram a linha de chegada, nesta ordem.
É claro que as versões sobre os possíveis motivos que levaram ao erro do brasileiro se multiplicaram nos anos seguintes, e a mais aceita foi uma perda de concentração por parte de Ayrton — ao ser aconselhado pela McLaren a tirar o pé. Qualquer que tenha sido a razão, o equívoco acabou se provando vital para a carreira do tricampeão, que triunfou em seis das sete corridas seguintes daquele campeonato, reverteu a vantagem de 15 pontos de Prost e conquistou o título com uma prova de antecedência.
Além disso, o mais impressionante: Ayrton simplesmente nunca mais perdeu em Monte Carlo. Depois daquela batida em 1988, Senna venceu as edições de 1989, 1990, 1991, 1992 e 1993. O erro, que poderia ter colocado tudo a perder naquele campeonato, é considerado até hoje o maior da carreira do tricampeão. Ainda assim, foi necessário para causar uma reflexão que mudou a vida do piloto e trouxe, merecidamente, a alcunha de Rei de Mônaco.
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