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Marcha à ré

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Em comemoração ao Dia da Indústria, em 25 de maio, o governo corre contra o tempo para lançar um pacote de medidas que proporcione o retorno do “carro popular”. A meta inicial era que o mercado voltasse a oferecer veículos com preço entre R$ 45 mil e R$ 50 mil, mas, convencido pelo setor automotivo, o governo teria chegado à conclusão de que esse objetivo é inviável e ajustado suas expectativas para um valor em torno de R$ 55 mil.

A condução do debate sobre o programa apresenta equívocos de origem. Em primeiro lugar, o preço do carro popular parece ser uma simples conta de chegada, sem nenhuma base a justificá-lo que não o marketing, o que revela o nível de improviso com que o tema tem sido tratado. A efeméride do Dia da Indústria, por sua vez, agregou um senso de urgência que favorece a adoção de soluções simplórias para problemas complexos, o que nunca é um bom caminho em se tratando de políticas públicas que se pretendem consistentes.

Os problemas do setor automotivo não são recentes. Produção e vendas estão estagnadas há anos. Com o aumento dos custos dos insumos durante a pandemia, novos critérios para reduzir as emissões e requisitos mínimos de segurança veicular, os carros mais baratos ofertados no País são vendidos por R$ 69 mil, valor inacessível para a maioria da população. O custo dos financiamentos subiu acompanhando a elevação da taxa básica de juros, enquanto a renda do trabalhador, corroída por uma inflação resiliente, não cresce há dez anos. É uma combinação trágica para um setor que tem excesso de capacidade instalada no País e que precisa de escala para se manter.

Para evitar demissões e fechamento de unidades, a estratégia da indústria tem sido adotar férias coletivas, cortar turnos e suspender a produção. Pátios de montadoras lotados são uma pressão adicional para o presidente Lula, sensível às demandas do setor que o projetou como líder político e em busca de uma agenda positiva para reconquistar o apoio de uma classe média empobrecida, endividada e impaciente. A pergunta que ninguém no governo ousa fazer é como o retorno do carro popular se tornou a resposta para esses problemas, quando ele representa o oposto do que o País precisa para crescer e de desenvolver de forma sustentável.

Ao que tudo indica, relançar o carro popular demandará uma nova rodada de desonerações, como se o setor não acumulasse privilégios tributários há décadas. A mais recente medida que entrou na mesa de negociações é a retomada da cobrança de Imposto de Importação de carros elétricos – aparentemente, há quem acredite que a isenção explica a falta de investimentos na produção desse tipo de veículo em território nacional. Mas é estarrecedor que, para reduzir o custo de aquisição do produto, o governo cogite ir além: autorizar o uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) como garantia dos financiamentos e retirar itens básicos relacionados a emissões e de segurança dos veículos.

Desde que se instalou no País, há cerca de 70 anos, o setor vive de permanentes subsídios fiscais e de proteção contra a concorrência estrangeira. A indústria automotiva tem todo o direito de fazer lobby junto ao governo para manter esses benefícios, mas cabe ao Executivo distinguir interesses privados de interesses públicos. Afinal, toda intervenção governamental em qualquer setor deve ter uma justificativa, pois ela gera custos e consequências de curto, médio e longo prazos.

Antes de propor mais uma política pública atrelada ao passado, o governo faria bem se avaliasse com coragem e realismo os resultados que programas anteriores, como o Inovar-Auto, do governo Dilma Rousseff, e o Rota 2030, de Michel Temer, trouxeram ao País em termos de eficiência, produtividade, inovação e crescimento. Somam-se a esse contexto as ações do governo com vistas à transição energética, uma agenda que o País tem todas as condições de liderar em termos mundiais. Nesse sentido, qualquer incentivo à aquisição de veículos e ao transporte individual, além do alto custo, representa, no mínimo, uma incoerência.

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