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XANGAI – Durante anos, as montadoras estrangeiras na China viram os clientes, como a família Cao, em Xangai, sendo atraídos pelas marcas de luxo. Mas isso parece estar mudando.
Ben Cao e sua esposa, Rachel, ambos de 36 anos, estão trocando os dois Porsches que possuem hoje por um novo Porsche 911 movido a gasolina, de US$ 290 mil, e comprando seu primeiro veículo elétrico, um SUV de US$ 70 mil projetado e fabricado na China por uma empresa chamada Li Auto.
“Se você está dentro de um Li Auto, a primeira sensação é de luxo”, disse Ben Cao, um consultor de negócios.
O crescimento das montadoras chinesas, muitas vezes subsidiadas pelos governos locais nas cidades onde têm fábricas, é uma outra mostra do domínio do país em carros elétricos. A China agora fabrica e vende – em casa e no exterior – a maioria dos carros elétricos do mundo. Sua proeza se estende a toda a cadeia de valor dos carros elétricos: fabrica quase todos os motores elétricos dos automóveis e refina a maioria dos produtos químicos usados nas baterias de lítio. A China também lidera no desenvolvimento do que poderia ser a próxima geração de tecnologia, as baterias de sódio.
Mais de 80% dos carros elétricos vendidos na China no ano passado foram fabricados por montadoras locais. No outono passado, elas ultrapassaram as empresas multinacionais no número total de carros movidos a gasolina ou elétricos vendidos por mês.
Concessionária com carros elétricos da marca chinesa Avatr em Xangai (Qilai Shen/The New York Times) Foto: Qilai Shen/The New York Times
Como as montadoras estrangeiras têm encontrado problemas na China, elas estão sendo pressionadas a mudar mais rapidamente para carros elétricos na Europa e nos Estados Unidos. A União Europeia e a Califórnia querem que as montadoras vendam apenas veículos com emissão zero até 2035. E o governo Biden propôs esta semana regras de emissões que exigiriam efetivamente que cerca de dois terços dos carros de passageiros novos vendidos nos Estados Unidos fossem elétricos até 2032 – padrões que algumas montadoras reclamaram serem muito rigorosos.
Com algumas exceções, como a Tesla – que a China acolheu em 2018 por sua tecnologia -, Pequim obrigou empresas estrangeiras a operar por meio de joint ventures com montadoras locais. Nas últimas quatro décadas, empresas multinacionais treinaram toda uma geração de engenheiros automotivos chineses – muitos dos quais agora trabalham para rivais domésticos altamente competitivos.
Hoje, o número de carros vendidos pelas joint ventures das empresas estrangeiras despencou, à medida que as vendas de veículos movidos a gasolina diminuíram e os veículos elétricos dispararam. Os carros elétricos representaram quase um quarto do mercado chinês no ano passado, em comparação com menos de 6% nos Estados Unidos, e devem chegar a mais de um terço até o final deste ano.
A Ford Motor vendeu 1 milhão de carros e caminhões leves na China em 2016 e 2017, mas apenas 400 mil no ano passado. A Hyundai Motor, gigante sul-coreana, vendeu 1,8 milhão de carros na China em 2016 e apenas 385 mil no ano passado.
A participação de mercado das montadoras domésticas da China aumentou de 47% em 2021 para 52% no último trimestre de 2022, em grande parte devido a um grande aumento nas vendas de veículos elétricos. A marca mais vendida é a BYD, da qual o bilionário americano Warren Buffett foi um dos primeiros investidores. Ela agora detém 10,3% do mercado de automóveis, acima dos 2,1% de quatro anos atrás e suplantando a alemã Volkswagen como líder da China.
A Volkswagen também perdeu participação, embora menos do que a maioria das montadoras estrangeiras. Ela planeja realizar a apresentação mundial de seu novo sedã elétrico ID.7 em Xangai na segunda-feira.
Mesmo as negociações em relação aos locais de exibição escolhidos em salões de automóveis como o de Xangai mudaram. Até os últimos anos, as montadoras chinesas competiam para colocar suas vitrines perto de marcas multinacionais como a Mercedes-Benz, na expectativa de que os compradores de carros chineses acorressem às marcas multinacionais e pudessem ver as marcas locais ao longo do caminho.
Mas, agora, são as marcas chinesas de carros elétricos que outras empresas querem cercar no showroom, disse Bill Russo, ex-CEO da Chrysler China.
“Você quer estar mais perto deles – as empresas chinesas têm os veículos elétricos a bateria mais ‘quentes’”, disse ele. “As montadoras estrangeiras não têm o mesmo apelo agora.”