(Bloomberg) — O novo modelo totalmente elétrico da picape mais vendida nos EUA, a Ford F-150, conta com alumínio para torná-la leve e veloz. Sem a demora de um motor a combustão, ela consegue disparar como um carro esportivo de zero a 100 km/h em cerca de 4 segundos. Não emite fumaça, nem faz barulho.
No entanto, seu impacto pode ser sentido na Floresta Amazônica, no Brasil. É lá que começa a problemática trajetória do alumínio da Ford F-150.
O alumínio usado para estruturar a cabine de passageiros da caminhonete pode ser rastreado desde o histórico complexo de montagem da Ford em Dearborn, no Michigan, a uma fabricante de peças na Pensilvânia, uma fundição no Canadá e, finalmente, até o Brasil.
No coração da Amazônia, a bauxita cor de ferrugem é extraída de uma mina que há muito enfrenta acusações de poluição e apropriação de terras. E, perto de onde o rio Amazonas deságua no Atlântico, uma refinaria que processa o minério é acusada de tornar milhares de pessoas doentes.
“Todo dia morremos um pouco”, diz Maria do Socorro, de 57 anos, da Associação dos Caboclos, Indígenas e Quilombolas da Amazônia (Cainquiama), principal autor do processo. Ela mora em uma cabana não muito longe da refinaria.
Os órgãos de seu neto irromperam pela pele no nascimento, e oito pessoas em sua família foram acometidas de câncer, diz ela, incluindo ela e seu marido, que ela diz ter morrido por causa disso. “Somos vítimas dessa empresa, a Hydro. Eles vêm, ganham dinheiro e não deixam nada para nós”.
A Ford, que começou a fabricar a F-150 Lightning EV em abril passado, a chama de “caminhonete do futuro”. Os veículos são a maior fonte de emissões de carbono nos EUA, e a mudança para elétricos é essencial para atingir o objetivo do governo de reduzi-las. Isso significa persuadir a classe média americana — não apenas os compradores ambientalmente conscientes que dirigem Teslas — a mudarem para elétricos também. “Isso pode mudar quem imaginamos dirigir uma caminhonete, quem dirige um EV, quem dirige um Ford”, disse a montadora.
Essa transformação precisa de alumínio. Muito alumínio. A demanda por peças de alumínio vem de todas as montadoras, especialmente aquelas que estão mudando para veículos elétricos.
A Ford, que trocou o aço pelo alumínio no exterior da F-150 a combustão em 2015, diz que usa cerca 310 kg do metal na versão elétrica, sem contar o que está na bateria e outros componentes pré-montados. Grande parte do alumínio que reveste a caminhonete, além do que a Alunorte fornece, também pode ser rastreada até a Amazônia, segundo uma investigação da Bloomberg News.
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Pesquisadores que estudam as comunidades ao redor da refinaria da Alunorte em Barcarena, nos arredores de Belém, descobriram que rios e córregos estão poluídos com metais tóxicos. Alguns estavam em níveis 57 vezes maiores do que os especialistas em saúde consideram seguro. Os moradores mostraram a Bloomberg os resultados dos exames médicos com níveis ainda mais altos — no caso de uma mulher, 175 vezes o limite de alumínio no cabelo e 81 vezes mais no sangue.
Os moradores de Barcarena contestam isso com a mesma veemência e acusam o governo de não fazer o suficiente para protegê-los. “A alumina produzida aqui é produzida à custa de muita miséria”, diz Ismael Moraes, o advogado brasileiro que se associou ao escritório de advocacia Pogust Goodhead, com sede em Londres, para mover a ação coletiva contra a Hydro na Holanda depois de não conseguir avançar em cinco casos relacionados à poluição no Brasil.
A ação busca responsabilizar a Hydro por 10 incidentes que resultaram em poluição e danos à saúde da comunidade, mais da metade deles anteriores à aquisição da refinaria em 2011. A Hydro, que nega as acusações, tem até 8 de março para apresentar uma resposta.
Um porta-voz da Ford disse que a empresa está investigando as questões levantadas pela Bloomberg. “A Ford está comprometida com uma cadeia de suprimentos que exceda os requisitos mínimos de conformidade regulatória e respeite os direitos humanos, incluindo o direito a ar e água limpos”, disse o porta-voz.
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