FOLHAPRESS – No final da década de 1970, as editoras americanas de quadrinhos de super-herói chegaram a um impasse -seus leitores infantis estavam ficando mais velhos e a serialização novelesca das suas histórias afastava cada vez mais a possibilidade de novos se interessarem.
Seus principais personagens já haviam mudado de uniforme, se apaixonado novamente, se casado, ou simplesmente morrido. A onda “adulta” desses quadrinhos ainda estava por vir e eles precisavam fazer caixa.
A solução foi apelar para uma manobra de continuidade retroativa que não ofendesse a fidelidade de quem continuava acompanhando as histórias e também servisse de recomeço para novos leitores. Usar o conceito de multiverso se mostrou uma decisão prática e criativa.
De tantos em tantos anos, seus personagens cairiam na porrada com um tirano intergaláctico e implodiriam realidades inteiras para recomeçar em uma nova, muitas vezes zerando a contagem da publicação.
Isso alienou alguns leitores, mas garantiu a longevidade dos gibis até Hollywood decidir que era hora de ganhar muito dinheiro com adaptações.
Se já era calvo em 2008 e segue insistindo em acompanhar essa série de filmes, não há nada de errado. Cada um faz o que pode atrás de um pouco de serotonina.
A questão é que financeiramente a saga anda perdendo fôlego. Suas continuações estão fazendo menos dinheiro que seus capítulos anteriores, e novos personagens andam falhando em atrair a atenção do público.
Uma manobra de continuidade retroativa se faz necessária. O novo filme do herói diminuto não faz isso, mas dá um primeiro passo.
A história mostra Scott Lang, o Homem-Formiga, Hope Van Dyne, a Vespa, e sua família sendo acidentalmente transportados para o Reino Quântico, onde precisam encontrar uma maneira de voltar para casa antes que o déspota exilado Kang os use para ele mesmo escapar do lugar e seguir com seu desejo arbitrário de destruir a galáxia.
O filme existe apenas para apresentar o novo tirano intergaláctico que vai passar a antagonizar os personagens do estúdio. Seu plano é acabar com tudo em todo lugar ao mesmo tempo, se unir às suas diferentes versões e implodir o máximo de ramos do multiverso que conseguir. Não há muito além disso.
O fim do vilão nesse filme é apenas o fim dessa versão específica. No multiverso, não existe peso em qualquer decisão ou caminho traçado. Esse filme quer preparar o público para um número sem fim de revisões e retomadas como os quadrinhos fizeram.
Como Francis Ford Coppola declarou recentemente: “Um filme Marvel é um protótipo de filme que é feito repetidamente para parecer diferente”. A questão é que a fórmula mais do que esgotou. Agora é a totalidade do universo que caminha para sua inevitável entropia e só Deus sabe se os Vingadores conseguirão reverter isso.
“Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania” falha em todos os aspectos técnicos, visuais e narrativos como nenhum filme Marvel antes. A improbabilidade quântica rende algumas ideias de personagens e situações divertidas no início, mas logo é usada para qualquer saída conveniente no roteiro ou álibi para reproduzir ideias e situações de filmes melhores como “Star Wars” ou “O Quinto Elemento”.
Se a estratégia dos filmes da DC/Warner de ressignificar clássicos da casa como filmes de herói funciona por se tratarem de filmes mais contidos, na Marvel/Disney, a ideia -por conta da obrigação de ambientar filmes futuros e manter o diálogo com os anteriores- vira cacofonia. O gato de Schrodinger não é mera conveniência narrativa.
Se você começou a acompanhar esses filmes com 15 anos, há grande chance de ter notado que cada vez menos filmes entram em cartaz.
Não é sensato dizer que uma coisa é responsável direta pela outra, mas o fato é que uma geração inteira já foi formada tendo os filmes da Marvel como uma das poucas opções do que ver no cinema. O crescente desinteresse do público nesses filmes pode muito bem significar também um crescente desinteresse em cinema no geral.
Vale notar que, quando os créditos terminam de subir em “Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania”, o público vê uma prévia de uma das séries Marvel no streaming Disney+.
HOMEM-FORMIGA E A VESPA: QUANTUMANIA
Avaliação Ruim
Quando Estreia nesta quinta (16) nos cinemas
Classificação 12 anos
Elenco Paul Rudd, Evangeline Lilly e Michael Douglas
Produção EUA, 2023
Direção Peyton Reed