Dirigimos o Patrol 4W, o jipe japonês 'quase brasileiro' dos anos 50

Projeto Memória Nissan mostra que a história da marca no país é mais longa do que se imagina

dirigimos o patrol 4w, o jipe japonês 'quase brasileiro' dos anos 50

Pense em um carro muito raro. Algo que mesmo quem curte máquinas e motores jamais ouviu falar… É o caso do Nissan Patrol de primeira geração – um 4×4 que foi montado em São Bernardo do Campo nos primórdios da indústria automobilística nacional.

Entre 1955 e 1956, a companhia Varam Motores – representante paulista das fabricantes Nash e Fiat – montou no Brasil cerca de 400 unidades do Nissan Patrol série 4W. Esses jipes eram feitos a partir de peças importadas, mas já traziam de 35% a 40% de conteúdo nacional. Foram os primeiros modelos de marca japonesa feitos por aqui, antes mesmo dos Toyota Land Cruiser.

Galeria: Nissan Patrol 4W no Brasil

O plano de aumentar a produção dos Nissan no Brasil, porém, não foi adiante e as instalações da Varam Motores, na Via Anchieta, foram repassadas à Simca em 1958. Ao longo das décadas seguintes, sem peças de reposição, os Patrol “quase brasileiros” desapareceram das ruas e da memória coletiva.

SOBREVIVENTE NO SUL

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Noticia do Nissan Patrol fabricado no Brasil 1955

No ano passado, contamos aqui no Motor1.com toda essa saga da Varam-Nissan no Brasil. Para nossa surpresa, pouco tempo depois da publicação da reportagem, fomos procurados por Vinicius Berwanger Sandri, dono de um raríssimo Patrol sobrevivente na cidadezinha de Cerro Largo, no noroeste do Rio Grande do Sul.

Segundo dados de emplacamentos, não restam mais do que seis desses jipes nipo-brasileiros no país, se tanto… Repassamos a notícia do Patrol de Cerro Largo a Rogerio Louro, diretor de Comunicação da Nissan do Brasil, que se entusiasmou com o aparecimento desse Santo Graal.

O ENCONTRO, FINALMENTE

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Apesar de estar oficialmente no Brasil há apenas 22 anos, e com fábrica em Resende (RJ) desde dezembro de 2013, a Nissan decidiu que já era hora de preservar sua história no país. Assim surgiu o projeto Memória Nissan.

Em um espaço da fábrica de Resende, foram reunidos o primeiro exemplar do March produzido no Brasil, todo assinado por funcionários da empresa (2013), o primeiro Versa nacional (2015), um March Rio (série comemorativa dos Jogos Olímpicos de 2016), um Kicks Rio (também de 2016) e a última unidade do Versa V-Drive feita no país (2021).

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– Buscamos um lugar onde pudéssemos concentrar carros marcantes, motores etc. Será uma referência para que novos funcionários, bem como clientes e visitantes, conheçam a história da empresa. O plano agora é ir preservando e ampliando o acervo aos poucos. Pode ser o primeiro passo para criar um museu daqui a algum tempo – explica Louro.

Na semana passada, um grupo de jornalistas automotivos esteve em Resende para a apresentação do projeto Memória Nissan. Aí, o ponto alto do evento: o Nissan Patrol foi trazido do Rio Grande do Sul especialmente para a ocasião. Vinicius, seu proprietário, estava presente como convidado especial, o que nos deu a chance de ouvir a história da restauração e fazer um pequeno test drive com o 4×4 pioneiro.

DESCOBERTA E RESTAURAÇÃO

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Em 1999, um amigo de Vinicius achou “um jipe diferente” no município gaúcho de Pirapó, na fronteira da Argentina. Estava em péssimo estado, no terreno de um senhor que comprava carros velhos, desmanchava-os e vendia peças.

– Era maior do que um Willys e ninguém sabia exatamente do que se tratava. Por falta de documentos, meu amigo desistiu da compra. Fiquei curioso, fui lá olhar e resolvi ficar com o jipe – conta Vinicius, que é engenheiro mecânico.

O que havia era um escombro sem motor nem câmbio, mas com chassi completo, os dois eixos e os feixes de molas na frente e atrás. A carroceria (já sem grade) estava toda coberta por uma camada superficial de oxidação e não havia qualquer traço de sua pintura original.

No painel e na parte traseira da carroceria, duas plaquinhas com a marca “Nissan” revelaram a identidade do jipe desconhecido.

A RESTAURAÇÃO

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Achar informações sobre o modelo não foi nada fácil. Vinicius pediu informações à Nissan no Japão, mas o que veio foi material referente à segunda geração do Patrol, lançada em 1960. Nem o museu da marca – na cidade japonesa de Zama – tem um modelo da primeira geração (série 4W). O jeito foi tocar a restauração usando bom senso e o material que havia à mão.

O motor original era o NAK Tipo A, a gasolina, de seis cilindros, com válvulas laterais, 3.670cm³ e 75cv. Tinha uma história curiosa: originalmente equipava os carros da Graham-Paige, fábrica americana que, em 1935, vendera estamparias, máquinas e direitos de produção à iniciante Nissan. Já o câmbio era de quatro marchas, com caixas de reduzida e transferência.

Na falta da mecânica original, Vinicius adaptou um motor 4.100 da picape Chevrolet C20 (também de seis cilindros) e 140cv – quase o dobro da potência com que o jipe saiu da fábrica. O cofre do motor do Patrol é tão amplo que o Chevrolet seis-em-linha vai folgado lá dentro. Não houve necessidade de cortar absolutamente nada na lataria.

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O câmbio original do Nissan era de quatro marchas mas, na sua ausência, o jeito foi usar uma caixa de três marchas dos utilitários Chevrolet dos anos 60. Um flange permitiu adaptar as caixas de reduzida e de transferência dos Jeep Willys, mantendo a tração 4×4.

Os eixos originais foram abertos, limpos e recuperados. Na traseira foram feitas pontas de eixo novas. Já o eixo dianteiro ainda é todo de fábrica – um detalhe curioso é que a carcaça do diferencial tem um “dente” para não bater no cárter do motor original.

O Patrol recebeu rodas e pneus modernos (Goodyear Wrangler MT/R 32X11.50R15LT), daí que foi preciso alargar o arco dos para-lamas traseiros. Os bancos dianteiros são de caminhões Scania antigos e foi adaptada uma direção hidráulica, que também coube sem problemas no cofre do motor.

– Uso bastante o Patrol, daí que fui aumentando sua segurança e conforto para viagens – conta o engenheiro que já foi até a Argentina ao volante do jipe Nissan.

SORTE E ROBUSTEZ

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Como em toda restauração, houve dificuldades mas também pequenos milagres. Um ano depois da compra do jipe, sua grade dianteira foi achada no meio do mato. Estava semi-enterrada e, apesar disso, em perfeitas condições e ainda com o embleminha da Nissan no lugar. Não foi preciso fazer nada além de lixar e pintar!

O chassi do Patrol tem longarinas bem mais parrudas que as do Jeep Willys, daí que não sofreu qualquer dano após anos encostado no chão, o que atesta a qualidade do projeto. Nada de trincas nem marcas de solda.

O volante original ainda existia – e só foi preciso improvisar um novo miolo. Todas as plaquetas de identificação da Nissan Motor Co. estavam no lugar.

dirigimos o patrol 4w, o jipe japonês 'quase brasileiro' dos anos 50

Ao ser achado, o Patrol estava com o quadro de instrumentos original, mas todo quebrado. Daí que Vinícius guardou os restos do painel para o caso de encontrar algum restaurador que consiga reconstruí-lo. No lugar, pôs um mostrador de Toyota Bandeirante, com formas retangulares semelhantes às do original.

A documentação foi feita por meio de um processo de usucapião. Como não sabia o ano exato de fabricação, Vinicius registrou o jipe como sendo de 1951, data de lançamento do Patrol no Japão.

Apesar das inevitáveis adaptações, o Patrol de Cerro Largo mantém a sobriedade visual. Conhecer de perto essa raridade chega a ser emocionante.

CONTATOS IMEDIATOS

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Hora de dar uma voltinha, inicialmente pelo terreno da fábrica da Nissan em Resende e, depois, pelas estradas ao redor.

Primeira impressão: visualmente, o Patrol 4W60 lembra muito um Jeep Willys 1951, só que em escala um ponto maior. Com 3,61m de comprimento total e 2,20m de entre-eixos, o Nissan supera o Jeep CJ-3A em 32cm e 17cm, respectivamente. Além disso, a carroceria do 4×4 japonês é 25cm mais larga, o que se traduz em mais espaço interno e comodidade para o motorista.

Vinicius, que trabalha em uma empresa de balanças rodoviárias, já pesou de seu Patrol: está com os mesmos 1.500 quilos com que saiu de fábrica.

Bem simples, a capota aproveita os pontos de fixação originais. Atrás do banco traseiro há pequenos porta-trecos com tampas – outra característica dos 4W60.

Chave girada com a mão esquerda e o motor desperta. Temos uma marcha a menos do que na caixa original do Patrol, mas o longo curso da alavanca do câmbio universal de três velocidades é puro anos 50! O acionamento é levíssimo, com a ponta dos dedos, e lá vamos nós: primeira para trás – “click” – segunda à direita e pra frente – “click” – terceira para trás – “click”…

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O volante de aro e raios fininhos, lembrando o do Land Rover Série 1, também dá o tom da época. E mesmo o ronquinho grave e baixo do motor Chevrolet a gasolina está dentro do espírito nostálgico. As adaptações foram a solução possível para que esse raro Patrol 4W60 voltasse às estradas – agora com mais potência e estabilidade, além do conforto da direção hidráulica.

Por ser um jipe, esse velho Nissan é duro – porém, com entre-eixos e bitolas maiores, é bem mais confortável e estável do que os Willys de seu tempo. Ficamos imaginando o que teria acontecido se a Varam não houvesse desistido tão cedo da produção do Patrol no Brasil. Será que o Toyota Bandeirante e o Jeep Willys teriam resistido por tanto tempo? 

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